Algures nos meandros do tempo, há milhares de anos atrás, houve alguém que tomou consciência de si mesmo e do mundo, para além do movimento mecânico dos dias e das estações. Algures, um de nós levantou os olhos do chão e descobriu que existia algo a acontecer, havia vida a pulsar, por todo o lado, e do inconsciente daquilo que seria um sonho, algo pulsou mais forte, fazendo-o acordar e observar a existência a acontecer.
Desde que nos conhecemos como humanos que procuramos expandir a ligação entre o consciente (aquilo que vemos ou sabemos) e o inconsciente (aquilo que não vemos e não sabemos), num diálogo constante, elaborado através da experiência mística e da união com o sagrado.
E do chão, rápido olhámos para o céu. O que distingue a nossa espécie de outras que ficaram pelo caminho de evolução, foi o acto de enterrar os nossos mortos, através de ritual. Este acto revela a consciência da morte, mas também a necessidade de perceber para além do óbvio, para além do visível, para além do aparente mecânico repetir dos ciclos. Tal levou-nos a inventar a arte, rumo à descoberta através do gesto e do ritual, com vista à expansão da consciência de nós mesmos e da vida.
Desde que nos conhecemos como humanos, que procuramos expandir a ligação entre o consciente (aquilo que vemos ou sabemos) e o inconsciente (aquilo que não vemos e não sabemos), num diálogo constante, elaborado através da experiência mística e da união com o sagrado. Esse diálogo é uma viagem contínua, que traz à luz sempre um pouco mais do potencial humano, que se encontra no escuro.
Foram inúmeras as culturas ao longo dos séculos que tornaram o rito e o mito parte integrante da sua vida, do seu quotidiano. E nesse processo, o consciente dialogava com o inconsciente. A linguagem do inconsciente é um mundo de símbolos e arquétipos e mitos. Quando falamos a linguagem do símbolo, a consciência expande-se para além do muro do conhecido.
Rápido chegámos até aqui, parece muito tempo, uns quantos milhares de anos, mas é uma fracção de segundo num universo gigante; a humanidade apenas desponta para a sua adolescência, provavelmente. E no século XX/XXI, principalmente no ocidente, perdemo-nos do contacto com o ritual, com o sagrado que nos faz imaginar e entrar num universo misterioso de descoberta da vida.
Sabemos que uma larga percentagem do nosso cérebro, assim como uma larga percentagem do nosso ADN ainda está por descobrir para que serve; existe ainda um universo inexplorado dentro de nós. A ponta do iceberg, ou seja, o que está visível acima da água, é o que conhecemos de um mundo inteiro de potencial desconhecido, inconsciente, escondido debaixo de água, oculto dentro de cada um de nós.
Em virtude do nosso desligar do universo do sagrado entrou um vazio, que desesperadamente procurámos preencher com a tecnologia e a ciência. Nada contra a ciência, como estaria aqui a falar contigo agora? Como teria acesso a tudo o que me faz sonhar?
Mas existe algo mais que faz o ser humano levantar os olhos do chão, numa ânsia de conectar com algo. Mas algures no caminho desconectámos-nos da nossa natureza, da nossa terra, do nosso corpo e criámos ilusões sobre o que realmente nos faz feliz.
Precisamos olhar para além da correria casa/ trabalho/ ganhar dinheiro/ estabilidade/ produtividade.
Despertemos para uma jornada de descoberta para investigar, para além da tela do aparente, dos mesmos cenários de apatia, stress e depressão. Despertemos para uma aventura, como herói que vai para além do seu mundo conhecido e descobre os seus dons, os seus contributos únicos, o seu propósito para a evolução da humanidade e do próprio universo. Esse herói existe em todos nós!
O sagrado é da essência do ser humano, e talvez por isso encontremos hoje tantas terapias alternativas, disponíveis para quem quer partir numa aventura de descoberta. Porque é urgente recuperar o diálogo com o sagrado.
Não é à toa que o fascínio pelo oriente e por culturas mais ligadas à Terra e à natureza, com os seus métodos e técnicas, sejam as opções que se encontram cada vez mais disseminadas e acessíveis.
Hoje, muitas dessas técnicas e métodos são cada vez mais fusões e recriações de diferentes partes do mundo, disponíveis para um crescente número de pessoas. A ligação que tínhamos já não nos serve (pelo menos não da mesma forma). E é mesmo necessário que criemos novas abordagens, pois copiar directamente de uma cultura é criar algo artificial, desconectado do meio ambiente, sem profundidade de imagem, colado, plástico, oco e sem conexão, nem interior, nem exterior.
Existem muitos símbolos e muitos arquétipos, tantos quanto há seres humanos. Precisamos fazer uma arqueologia pessoal e colectiva daquilo que ressoa em nós, para que haja diálogo com o inconsciente, para que venha à luz um pouco mais da ponta do iceberg. Precisamos descobrir e redescobrir os símbolos do inconsciente colectivo ocidental, encontrar os nossos arquétipos colectivos e pessoais, redescobrir os nossos deuses e mitos, os nossos heróis; e reinventar uma forma de comunicar com eles.
Reconectemos com o ritual, com o sagrado, mas de uma forma que faça sentido, que fale uma linguagem, que comunique com todo o potencial que temos dentro de nós e que nos desperte do sono, que nos acorde para o universo que existe dentro de nós.
Encontremos de novo os nossos ritos, sem preconceitos, sem fundamentalismos, sem ficar presos à ideia mental de como deve ser isto ou aquilo.
O ocidental tem o mega desafio, de redescobrir-se na sua ligação com o sagrado, procurar a chave, procurar as chaves, que abrem a porta para o interior, para que possa preencher a sua vida com a magia da descoberta de quem é realmente, dos seus sonhos; para que cada um de nós resgate a luz que nos conecta com o universo.
Para que possamos levantar os olhos do chão, levantar a cabeça para o céu, com os pés na terra, de acordo com a nossa natureza, como parte do todo, conscientes da vida que pulsa dentro de nós… inteiros, dentro de nós… para que nos lembremos do que nos faz viver a vida de forma reverente, irreverente, realizada, feliz.
Referências bibliográficas:
Campbell, Joseph, The Heroe With The Thousand Faces. 1949
Jung, Carl, Archetypes of Collective Unconscious. 1959